ESTRELA DE BRILHAR

Bernardo Bravo/João Felix

Eu vasculhei esse mundo atrás de um segredo 
Um doce momento que fosse me levar 
Por essa vida afora alado em contento 
Eu surgisse inteiro e faceiro 
Com o vento eu pegasse carona 
Na cauda da estrela bonita longínqua mais linda que há

Lá no seu olhar é pra lá que eu vou

Era vontade que eu tinha cá dentro do peito 
Que tu fosse minha estrela de brilhar 
Por esse escuro na noite 
Trançar teus cabelos com o pente da sorte 
Laçar os desejos com a força do toque 
Lavar nosso medo deixá-lo na corda branquinho a secar

Só pra desfraldar o pendão do amor

Eu quero deixar registrado no tempo e no espaço 
Que aqui nesse caso o acaso é que é senhor 
Do meu destino e da sina 
Que eu vi numa noite estrelada vidrada 
Na tua retina menina meu dengo ilumina o anseio 
Que eu tenho de ser o lençol desse céu

Pra te abraçar quando o sol se por

RELATIVIDADE

Tó Brandileone/Celso Viáfora/Leo Biachini

Para quem vem de Alter do Chão
A torre Eiffel é o topo do mundo
Maior que tudo
Para quem vê do avião
Paris parece que cabe na mão

Para um francês da Côte-d’Or
O rio Sena é o tamanho do mundo
Maior que tudo
Pro paraense o Sena é só
Um pedaço do rio Tapajós

O que prova a relatividade
Do maior em relação ao que é menor
Melhor ou pior
Nada assim que, na verdade,
Tenha grande utilidade

Livros levam horas
Pra narrar o conteúdo
Que se pode revelar
Dentro de um olhar
Flash de um segundo
Que uma enciclopédia não dirá

Há quinhentos anos
Levaríamos quinhentos anos
Para se chegar onde a gente está
Hoje leva-se um minuto
Pra daqui a um minuto

Então me pergunto
Contemplando a madrugada
O que isso tudo quer dizer
E posso dizer
Que isso tudo não diz nada
Tanto quanto eu pra você

INIMAGINÁVEL

Troy Rossilho / L. F. Leprevost

Um dia eu vou me perder
Eu vou entrar fundo
Eu vou atravessar a fronteira
Mais escura do mundo

Um abismo nublado
Pode estar tramando algo
Inimaginável
Inimaginável

Eu vou fazer turismo
Dentro do próprio organismo
Eu vou me aventurar no meu centro
Não posso fugir de mim se só tenho saídas pra dentro

Eu vou me aventurar no meu centro
Não posso fugir de mim se só tenho saídas pra dentro

EBULIÇÃO

Maninho

Vem me dizer outra vez
Que eu falo demais
Vem repetir teu clichê
Que eu finjo gostar

De agora em diante
Seu tempo acabou meu bem
Eu quero alguém disposto a dar
O que você não tem

Eu passo a diante
E faço uma aposta
De mim você gosta
E diz que não
Gosta e diz que não

Eu vou cuidar de mim
Não venha com discursos
De querer mais uma chance
E quando eu chego nesse ponto
Eu não respondo

RESSACA

Thamires Tannous/Estrela Leminski

Depois de tudo
Nós e o deserto
Ao invés de você
A porta, então, se abre
De tão perto
Você me reparte
Eu no aperto
E você só porto

Aparto o grito abafado
Deságuo, enfim, no tempo aflito
A desencarnar pelo mar morto

No mar de dentro
Só corais sem cor
Um transformar
Só no interior
Eterna busca de algo maior
Mas um desfecho
Que eu já sei de cor

Já somos, ambos, outro alguém
Um ser, um nó sem mal nem bem
Você, ninguém, um nada mais além

ASA

Djavan

A manhã me socorreu com flores e aves
Suaves, soltas, em asa azul
Borboletas em bando

Diz que pedra não fala
Que dirá se falasse
Eu, Ana?
Me ama
Me queima na sua cama

O veludo da fala
Disse: Beijo, que é doce
Me prende, me iguala
Me rende com sua bala

Se disfarce de Zeus
De Juruna, na deusa Azul
Se me comover
Eu já sei que é tu
Claridade de um novo dia
Não havia sem você
Você passou e eu me esqueci
O que ia dizer

O que há pra falar
Onde leva essa ladeira
Que tristes terras vencerá
Um intérprete tocando Blues?

O que há pra falar
Onde leva essa ladeira
Que tristes terras vencerá
Um intérprete inventando Blues?

O que há pra falar
Onde leva essa ladeira
Que tristes terras vencerá
Um intérprete delirando no Blues?

CICATRIZ

Maninho/Leonardo Vergara

Lá fora faz um frio danado
Igual ao que sinto aqui por dentro
Que atravessa o pensamento
E vai parar no fundo
Onde a minha alma canta
E onde o meu amor não para de dançar

O vento afasta o que era perto
E leva junto o meu lamento
E deixa o coração aberto
Feito ferida
Não deixou cicatrizes
E continua viva
Só querendo viver

E se diverte com meu jeito
De lidar com a febre
Como se fosse verão

E acha graça quando eu venho
Respirar bem de perto
Como se fosse curar

QUANDO AMANHECER

Maninho

Quanto mar que cabe em mim
Lanço-me sem ver
Onde os pés não podem ir
Parto sem saber

Quero adormecer ouvindo tua voz

Quantas noites meus amores
Fico a proteger
Em meus pensamentos mansos
Guardo um tudo, um bem

Quando enfim buscar do alto a voz
Quando amanhecer e houver amor
Quando as mãos tocarem-se
Algo vai acontecer

Que tua paz invada
Que teu bem me afronte
Que tua verdade encontre enfim lugar
Em mim

BASTA CLAREAR

Du Gomide

Tempo de quem não tem tempo
Perceber o vento que veio assoprar
Quase como um lamento
De quem não tem tempo pra vivenciar

Quando a chuva cai não pode se molhar
Quando vem o sol está quente para amar em paz
Nunca vai viver assim

E a noite vem se tem alguém pra se abraçar
É bem melhor que ter mais um tormento a lamentar

Noite toda noite é morte
Toda vida é morte, todo céu é mar
Todo o contratempo é tempo
Todo risco é ponto pra finalizar

Basta clarear o brilho do olhar
E quando ver a luz do sol não pensar em nada mais
Só é chover pra se banhar

De água e sol, de lua e terra, sal do mar
Saber que é muito mais que um alcatraz pra se trancar

ANÉIS DE FLOR

Maninho

Chega no fim da tarde
Diz que já faz parte chegar assim
Molha os seus pés na margem
E tal qual miragem sorri pra mim

Prende um olhar na terra
E diz que me espera o tempo que for
Lança um beijo no ar
Diz que vai voltar com anéis de flor

Me faz perder o tino
Quando diz que é meu o seu coração
Mexe com o meu destino
Tece um véu com um fio de esperança meu

Prende um olhar na terra
E diz que me espera o tempo que for
Lança um beijo no ar
Diz que vai voltar com anéis de flor

Diz que vai voltar
Pra me coroar
E que mal que há
Em se ter assim

Diz que voltar
E que me trará
Os anéis de flor
Pra me encher de amor

NA PELE

Maninho

Quase que se perdem e por quase nada
Parte que se parte vai
Antes de alguns giros a terra se perde
E parece ver pra crer

Quando se completam
Quando se encontram
Quando a luva cai
E as mãos se dão

Duas naturezas, mais eternidades
O que não tem nem plural
Nasce o impossível
Quebra o inquebrável
Prova o que improvável tem

Quando eles se olham
Quando as pernas tremem
Um segundo é muito
Falta eternizar

Luz, luz, que clara luz
Luz que quer se dar
Mais, Mais, se querem mais
Mais que sempre
Tão superficial
Que se vê o que há dentro
E mais